Para Tunin Pipoqueiro, o anjo da Praça Matriz de Santa Rita do Passa Quatro, in memoriam

"Não corre, menina! Vai ralar os teus joelhos no chão!" Assim dizia minha mãe toda vez que eu, chegando na Praça Matriz da minha cidade poema, saía correndo na direção do pipoqueiro. Ele, vestido de jaleco e boné branco na cabeça, pacientemente alegrava e perfumava o ar com os estalidos da panela e o aroma da pipoca, como uma figura etérea posicionada estrategicamente na calçada portuguesa preta e branca daquela praça.

Eu não me importava de ter joelhos ralados! E tantas vezes, trôpega e ofegante, eu apenas passava minhas mãozinhas de criança nos machucados e saía correndo para, de frente ao pipoqueiro (Tunin, era esse seu nome), esperar minha vez de comprar pipoca e com as mãozinhas suadas e os dedos sujos de sangue, saboreá-las, numa mistura de molho de pimenta picante com sangue.

E assim aconteceu tantas vezes! O mesmo conselho de minha mãe, a minha mesma ânsia, o mesmo machucado e as mesmas pipocas com sangue! Perdi as contas de quantas vezes na minha infância eu corria para colocá-lo dentro do meu olhar de menina, aquela figura etérea, quase um anjo, de fala doce e olhar bondoso: “você quer a pipoca de qual tamanho? Pequena, média ou grande?” E sorria. Mal sabia que o seu sorriso me abria as portas do paraíso! Eu sempre queria a grande! Porque grande eu queria a vida, os sonhos, correr grande pela praça, abraçar o vento, brincar com as águas da fonte luminosa enquanto minha mãe, distraída, conversava com suas amigas e me deixava em liberdade vigiada, trancada na minha meninice…


No alto, a cruz de néon azul da igreja nos abençoava. Às vezes, a banda dava o ar de sua graça e fazia tudo aquilo parecer ainda mais um filme tipo "Cinema Paradiso", com todos os personagens ali estrategicamente selecionados.

Eu não sei dizer quando tudo aquilo terminou para mim. Talvez tenha sido em um dia em que minha infância abraçou minha juventude e eu saí sem me despedir. Talvez tenha sentado no banco dos namorados para observar a vida se tornar adulta e difícil, enquanto outras crianças tomaram meu lugar…

Mas ainda me lembro de minha mãe me pegando pelo braço na hora de ir embora, com um olhar sério, dizendo: "Vamos logo para casa, demo!" Em um dialeto italiano misturado ao português que provavelmente herdara de sua mãe, filha de calabreses. Eu sempre era retirada no auge da festa, pois era hora de dormir, tomar leite e colocar o pijama... antes que também ralasse os cotovelos, e começasse a tagarelar sem parar, tirando sua paz.

Ainda consigo lembrar do meu olhar de relance, sem tempo para despedidas... Meu pequeno braço estendido em direção à mão de minha mãe, que me puxava. O chão da praça em preto e branco, como um portal do tempo que abraçava o céu repleto de estrelas e colocava aquela figura etérea como eterna em minha alma, lançando-me para um futuro de lutas e esperas.

MARINELA CARNIATO

marinelacarniato@gmail.com


John Doe

Envie seu comentário




Entre em contato

Rua Victor Meirelles, 301 - CentroSanta Rita do Passa Quatro-SP

(19) 3582-6363

santarritense@santarritense.com.br

Redes Sociais